sábado, 26 de abril de 2025

EU TIVE UM SONHO

Caros leitores,

O texto de hoje é de autoria de J.Tucón.

"Eu tenho um sonho..."     Martin Luther King Jr.

Estava eu a bebericar meu café na padaria do bairro quando um tipo se aproximou da minha mesa e me disse ansioso:

- Poderia falar um pouco com o senhor?

- Claro! - respondi - Sente-se, por favor.

Aí comecei a reparar nele.  Tratava-se de um homem aparentando estar na faixa dos setenta anos, elegantemente trajado, elegante demais para aquele lugar.

- Bem, primeiro vou me apresentar.  Chamo-me Emmanuel K. Jr.

- Muito prazer, sou J.Tucón.

- Desculpe-me interromper o seu café desta maneira, mas ocorre que estou muito ansioso.

- E por que está assim?

- Por causa de um sonho que tive.

- Então nada lhe resta a não ser relatá-lo.

- Posso começar?

- Claro! Vá em frente!

- Bem, tudo começou quando eu e minha esposa, Sandra H.K. resolvemos passar alguns dias nos Estados Unidos.  Compramos um par de passagens de ida e volta, isto faz uns seis meses.

- Desculpe-me interromper: compraram de fato?

- Sim.

- Prossiga, por favor.

- Nós moramos aqui em Curitiba.  Daí que temos que nos deslocar até São Paulo para pegar o avião até Dallas.

- E?

- E daí que temos opiniões diferentes de como ir a São Paulo: ela quer ir de avião e eu de ônibus.

- Chegaram a um acordo?

- Sim, compramos as passagens de avião para São Paulo.

- Bem, e o sonho?

- Bem, é aí que tudo começa.  No sonho já estamos a bordo aqui em Curitiba, com o avião pronto para partir quando surge um funcionário da companhia que expõe aos passageiros que foi vendida uma passagem a mais de última hora e que um dos passageiros terá que desembarcar.  Pediu que alguém se apresentasse de forma voluntária.

O silêncio tomou conta da cabine.

Talvez tenham passado uns dois minutos.

Não podendo se conter, o funcionário disse que a companhia escolheria algum idoso que estivesse viajando sozinho e que essa pessoa teria que desembarcar e que lhe seriam dados hotel, restaurante e uma nova passagem.

A cabine permaneceu em silêncio.

- A questão é: por que dar preferência a um passageiro de última hora?

- Não sei dizer, Sr. Tucón.  Sei que chamam a isso de "overbooking": vender mais lugares do que os disponíveis.

- Estelionato mudou de nome!

Prosseguindo o sonho: o funcionário leu o nome do passageiro "eleito": Emmanuel K.Jr.

Embora tivesse levado um choque, permaneci em silêncio, assim como toda a cabine.

- Emmanuel K. Jr! - disse ele novamente.

O silêncio persistiu.

E assim permaneceu.

- O sistema sabe onde o Sr. está sentado, Emmanuel.  Por favor, levante-se e deixe a aeronave!

Permaneci sentado e em silêncio.

Assim também toda a cabine.

O funcionário fala algumas palavras num celular e se retira.

O silêncio continua.

Daí a pouco o funcionário volta acompanhado de dois policiais que se dirigem ao local onde eu estava sentado.  Minha esposa intervém e diz que somos casados e estamos viajando juntos e que tudo não passa de um erro.

O funcionário retruca histérico:

- O último nome dele é Júnior e o último nome da senhora é K.  Não me venha com essa! Mentir é feio, madame!

- Quer dizer: o analfabetismo venceu mesmo!

Mas, voltando ao sonho: como eu estava viajando com passaporte estrangeiro, disse: Sandra, procure o consulado para resolver isso!

E fui conduzido ao posto policial.

Lá, fui acusado de fomentar a desordem e o tumulto.

Queriam me tirar o passaporte estrangeiro mas, o advogado do consulado chegou a tempo e eu fui posto em liberdade.

- Tem mais?

- Tem sim, Sr. Tucón.

- Prossiga, então.

O sonho prossegue com meu advogado particular entrando com um processo contra a companhia aérea.  Fui extremamente bem sucedido.  Ganhei uma indenização realmente milionária.  Mas, o que estranhei foi a atitude do meu advogado.

- O que ele fez?

- Não foi o que ele fez, mas o que ele disse.

- Continue, por favor.

- Vitória de Pirro, Emmanuel.

- Por que diz isso? - retruquei.

- Não nego de jeito nenhum que você esteja coberto de razão.  Você recebeu uma indenização milionária; eu recebi honorários, como se diz, polpudos. Mas, e daí? Tudo se resolve com uma indenização? Onde estão as punições às pessoas que o maltrataram? Parece que a indenização cobre uma multidão de crimes...

- Termine!

- Já terminei.

- Sente-se menos ansioso?

- Não sabe como!

- Então é minha vez...

- Diga, Sr. Tucón.

- O que eu quero saber é: o silêncio sepulcral em que a cabine esteve mergulhada durante todo esse episódio, o que é? Solidariedade ou Submissão?

Boa Semana, pessoal!


 

Um comentário:

  1. O texto me lembrou uma frase de Martin Luther King
    " O que me assusta não são as ações e os gritos da pessoas más, mas sim a indiferença e o silêncio das pessoas boas."

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