Caros leitores amigos,
Hoje vos trago mais uma fábula, a qual também traz interpretações de Hammed. Essa fábula originou a expressão "pai/mãe/pais-coruja".
Eis a fábula:
"Depois de muita briga, a águia e a coruja decidiram pôr fim à sua guerra. Um abraço selou a nova amizade e prometeram ambas, com sinceridade, não devorar os filhotes das rivais. Disse a coruja:
- Basta de luta. O mundo é tão grande! Não existe maior tolice do que andarmos a comer as criais uma da outra.
- Perfeitamente. Também eu não quero outra coisa - respondeu a águia.
- Nesse caso combinemos isto: de agora em diante não comerás nunca os meus filhotes.
- Muito bem. Mas como vou distinguir os teus filhotes? Descreve-me tais quais eles são, que, juro, haverei de poupá-los.
Ante tal compromisso, a coruja, satisfeita, disse assim:
- Meus filhos são mesmo uma graça, cada qual mais bonito e de talhe bem-feito. A penugem que ostentam é fofa e vistosa; sua voz, doce e suave. Se os achares, haverá de ver que mimos tão gentis não merecem morrer.
Feito o pacto, saiu cada qual para um lado. A coruja, em busca de alimento, voou para um bosque afastado; já a águia, com atrevimento (porquanto as águias não têm medo), entrou nas fendas de um rochedo, e ali logo encontrou uns bichos esquisitos, verdadeiros monstrinhos, gemendo tristonhos, penugem horrível, emitindo gritos de som assustador.
- Esses bichos medonhos, provavelmente da coruja não serão. Assim, não há problemas: vou comê-los agora.
E ali se fartou abundantemente.
Um mau pressentimento tomou conta da coruja e a trouxe de volta ao ninho. Chegando, ela avistou, numa aflição extrema, os restos da chacina e chorou amargamente. Protestava aos gritos clamando aos céus por castigo e foi ajustar contas com a rainha das aves.
- Quê? - disse esta, admirada. Eram teus filhos aqueles monstrenguinhos? Pois, olha não se pareciam nada com a imagem que deles me fizeste. Tu pintaste um retrato que não corresponde, de fato, a filhotes de coruja; assim, não atribuas culpas a outrem. Se as há, são só tuas!"
Entende-se melhor agora esta expressão onde os pais supervalorizam seus filhos e não percebem neles nenhum defeito, tanto externo (parte física), quanto interno (parte psicológica/espiritual). Muitas vezes, no desejo de manifestar amor e carinho muitos pais superprotegem os filhos não notando que este comportamento destrói o desenvolvimento social e emocional dos mesmos.
Pais que supervalorizam seus filhos tendem a superprotegê-los exercendo sobre eles, o que Hammed chamou de "dominação asfixiante", mas em contrapartida, nesse comportamento, há falha de firmeza no que diz respeito às reais necessidades psicológicas da criança, pois para impor essa submissão, enche-os de mimos e agrados. É como se eles tivessem receio que a criança deixasse de ser aquilo que eles acreditam que ela é. Não há consciência da realidade.
Então, esses pais super protetores afastam e resguardam excessivamente seus rebentos, desde cedo, de todos os perigos que eles acreditam que exista, trazendo desta maneira, impossibilidades para que essas crianças desenvolvam sua própria defesa em sua existência.
Esse tipo de comportamento é muito mais comum do que se possa imaginar. E ocorre não somente quando os filhos são crianças, mas pode adentrar a vida adulta e perpetuar-se até o fim da vida dos filhos.
Cada pai e cada mãe temem que seus filhos sofram - muitas vezes, eles acreditam que as tribulações e padecimentos deles são desnecessários para suas vidas, então os defendem dessas experiências evolutivas. Entretanto é sabido que cada pessoa deve passar pelas suas próprias experiências a fim de amadurecer para a vida. A vivência natural de cada uma promove uma série de aprendizados. Pais que super protegem sua prole são pais de vontade e firmeza fracas. Quando são acusados de serem permissivos a qualquer teimosia ou capricho e impossibilitados de negar qualquer coisa, alegam que seus filhos exercem um "fascínio" sobre eles aos quais não podem resistir.
Outra atitude comum em pais, no que diz respeito à educação de seus filhos, é o de apontarem defeitos na educação do filho da vizinha ou da amiga. Já foi dito em outo texto que existe uma tendência inconsciente a projetar nossas características psicológicas nos outros, quando não conseguimos as ver em nossa personalidade. Pais que criticam a educação que outros pais dão aos filhos podem não estar conseguindo ver suas próprias falhas no sistema educacional ministrado por eles aos próprios filhos. A ideia aqui é trazer à tona essas possíveis falhas, refletir sobre elas e se der, corrigi-las.
Quando os pais cobrem seus filhos de elogios, de mimos e de exagerada afetividade, no futuro, essas crianças serão pessoas inseguras e frágeis. Eles podem inclusive levá-los à "morte como indivíduos", em analogia com a fábula: "esses bichos medonhos, provavelmente da coruja não serão. Assim, não há problemas: vou comê-los agora". Como não lhes foi dada a possibilidade de crescerem através das experiências da vida, tornam-se, também, na vida adulta, criaturas infantilizadas. Esse tipo de personalidade, infelizmente, também é bastante comum no mundo atual.
Se você foi uma dessas crianças educadas por esse tipo de pais, o momento de crescer é agora. Liberte-se do passado, olhe para a vida de frente, enfrentando seus percalços e tomando decisões. Se isto delinear-se difícil para você, procure ajuda, respire fundo e vá adiante.
Caros amigos vejam como é trabalhoso realizar mudanças na vida adulta quando se teve esse tipo de educação. Então voltemos nossa atenção novamente para os pais. Existem muitos motivos para pais serem super protetores; eis aqui alguns dos mais frequentes:
- como uma forma de auto compensação, pais que foram rejeitados na infância podem querer proteger seus filhos acima do normal, pois estariam fazendo o inverso do que ocorreu com sua própria educação;
- quando a criança possui enfermidade grave ou defeito congênito ( nascido com o indivíduo; inato);
- filhos únicos ou "temporãos";
- filhos adotivos;
- a morte de um irmão (um dos filhos), etc.
Hammed sugere uma lista de atitudes comuns que permite o reconhecimento de um adulto super protetor:
- relação maçante e pegajosa com a criança, sempre ao lado dela, controlando-lhe todos os movimentos, vigiando-a incansavelmente;
- quando o adulto afirma aos outros que o filho não se afasta dele nem por um minuto, mas na realidade é o oposto: são os pais que não conseguem se afastar dos filhos;
- tratamento inadequado, como se a criança fosse mais nova ou mais infantil do que na realidade é, criando assim uma atmosfera de bloqueio ao seu amadurecimento - pais que tratam seus filhos como incompetentes ou idiotas - embora nossos filhos entendam tudo o que dissermos a eles;
- esforço hercúleo e não natural para que os filhos não saiam do ambiente familiar, pois acreditam que eles não têm capacidade para se autogovernarem fora do lar e impedindo-os, desta maneira, de se desenvolverem socialmente e serem responsáveis por seus atos - esta atitude pode ser consciente ou não;
- pensamentos catastróficos que podem trazer uma submissão neurótica dos filhos;
- chantagem emocional incutindo ideias de culpabilidade e servilismo, através de afirmações tais como: "Passei muitas noites em claro quando você era bebê", "Quase morri em seu parto", "Sacrifiquei toda minha juventude por você", "Você deveria ser grato, porque me mato por você", "Sempre faço tudo primeiro em seu favor".
O que as crianças necessitam em sua infância é de elogios verdadeiros e não supervalorização; elas precisam ser reconhecidas pelo que elas são e não pelo o que os pais pensam que elas são.
O adulto também pode estar projetando em seus filhos, seus receios e medos, e o principal deles é a "perda" do afeto dos entes queridos. No vocabulário familiar "perder" sugere "ficar sem a posse de alguém". Então reflitamos nessas questões:
Somos realmente "donos" de nossos filhos, maridos/esposas, amigos, parentes? Ou estamos com eles num momento transitório da vida, compartilhando a casa, o trabalho, e algumas experiências?
Boa semana!
Meus pais sempre exigiram responsabilidade, pouco carinho, pouco abraço. Fizemos o mesmo com nossa filha, mas ela, quando adolescente, nos acordou.🙏❤️
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