Caros amigos leitores,
Esta semana fiquei a refletir sobre o que escrever nesse espaço. Dentro do ônibus, em minhas andanças pela cidade, tive a ideia desse texto. Há 13 anos atrás vendi meu carro, ainda quando morava em São Paulo, e, de lá para cá nunca mais dirigi e nem tive outro carro.
Até os dias de hoje, muitas pessoas me perguntam, perplexas, porque não tenho carro.
Essa decisão nem foi exatamente e completamente minha. Meu marido, quando começamos a namorar não tinha carro e, enquanto eu tinha o meu, eu dirigia para nós dois, pra cima e pra baixo.
São Paulo foi ficando uma cidade difícil para o carro - o trânsito era (creio ainda o ser) intenso, e sem lugar para estacionar. Ao mudarmos para Curitiba, escolhemos uma casa que fica perto (umas cinco quadras) de um terminal de ônibus expresso que trafega numa canaleta exclusiva, embora os ciclistas não acreditem nisso. De minha residência até meu consultório no centro da cidade levo de 20 a 30 minutos
Bem, obviamente há algumas desvantagens em não ter carro. Por exemplo, se ando leve, sem problemas; mas muitas vezes há que se carregar guarda chuva (aqui chove muito), alguns pertences, livros, casaco, etc. Quando morava em Sampa, trabalhei uns 15 anos como professora particular de inglês - dava aulas em empresas, e em domicílio - nessa época, tinha carro porque tinha que levar livros, gravador.
Outra desvantagem - ao fazer viagens curtas para outros municípios, o campo ou a praia, tenho que enfrentar ônibus de viagem (dependendo da distância a percorrer) - hoje, felizmente ainda temos o Uber.
Entretanto, quando estava pensando nesse texto percebi mais vantagens do que o contrário.
A sensação de liberdade ao caminhar para nosso destino, ou ter que tomar o ônibus quando a distância é grande não tem preço. A maioria das pessoas acredita que ter carro é ter a sensação de liberdade e não ter que "depender" do transporte coletivo.
Reflitamos: com o carro vem: o mecânico, o posto de gasolina, o borracheiro, o pagamento do IPVA, a limpeza/lavagem do carro, a renovação da habilitação, a troca de peças quebradas, o pagamento do estacionamento, e por aí vai uma dedicação sem fim. Você perde muito tempo cuidando e pensando nele, como se dele dependesse a sua vida (bem, algumas pessoas acreditam que depende...) Se ele dá pane no meio da rua ou de uma rodovia, haja paciência e tempo não só para contatar um auxílio, guincho, por exemplo, como também aguardar sua chegada. Se o ônibus que você está quebra ou dá um problema é só sair dele, esperar outro, ou até buscar soluções alternativas - larga-se ele lá e vai-se embora. Com o carro é diferente - não dá para largá-lo lá.
O ponto principal ao qual me ative para escrever esse texto foi a observação do meio social quando se está num coletivo. Se não tivesse escolhido ser psicóloga clínica, teria sido psicóloga social. O ser humano é uma criatura excepcional para estudo - tem-se de tudo no ônibus, na rua: ambulantes, jovens com seus celulares em punho, idosos com suas bengalas, chapéus, salto altos e hoje, calças rasgadas - esse item uniformiza a todos e, infelizmente, atualmente as pessoas vestem-se muito mal (já relatei esse fato em outro texto meu "Porque a beleza importa"). Esqueci das crianças que falam alto, mas até que elas são raras no ônibus. Os pais precisam ter carro para levá-las à escola.
Como eu ia dizendo, outra característica prazerosa, para mim é ver a natureza pela janela (quando viajo sentada; pensando melhor, até de pé consigo admirar a natureza pela janela). O percurso de minha casa para o centro e vice-e-versa é muito bonito - há árvores, flores, pássaros, gatos, cães - o trajeto passa pelo Jardim Botânico. Curitiba é realmente uma bela cidade - tem crescido, tem muita gente e com isso também vem o barulho e a sujeira, mas ainda é uma boa cidade para se viver. Ao caminhar a pé você, além de se exercitar, acaba conhecendo pessoas, lugares, flores, árvores, animais. Dentro de um carro você até pode também admirar essas coisas, mas muitas vezes há que se ater ao volante ou a se enraivecer perante os percalços não só da via como também dos outros motoristas.
Quando vendi o carro senti-me muito triste, pois gostava de dirigir e também achei que tinha perdido um "poder" - "eu sei dirigir, tenho esse "poder". Hoje, ao contrário, adquiri um poder maior - o de ter minha liberdade de ir e vir quando meu aprouver. Sem contar a economia financeira adquirida - afinal de contas, o custo de um carro é muito alto e conheço pessoas que não possuem casa própria, mas possuem o carro do ano - uma questão de escolha e prioridade. Hoje em dia, em minha opinião, há três coisas que possuem um alto custo financeiro: filhos, pets e carros.
Acredito que muitas pessoas ao lerem esse texto podem achar que sou biruta por preferir não ter carro - mas, é que essas pessoas nunca ou quase nunca andam a pé ou de coletivo, e assim não têm essa experiência - só imaginam.
Uma vez, quando frequentava um curso, percebi que um colega sempre tinha o tênis bem limpo e praticamente novo - a sola era pouco gasta e aí perguntei à ele se ele "levitava" ao invés de caminhar e ele me contou que descia de seu apartamento pelo elevador, pegava o carro na garagem, dirigia até o local do curso, colocava o carro no estacionamento ao lado do local do curso e praticamente não caminhava na rua e então, "Voilá!" - o tênis não gastava.
Felizmente, aqui em Curitiba o preço dos calçados, tênis e botas não é caro. Troco tênis e botas todos os anos - não só porque ando muito, mas porque as calçadas e, principalmente, o calçadão da XV de Novembro, acabam com eles.
E aí pessoal, bora caminhar e curtir o meio social?
Até!