Olá amigos,
A reflexão de hoje foi motivada pela terceira regra do novo livro de J.Peterson "Além da Ordem - Mais Doze Regras para a Vida": "Não esconda coisas indesejáveis na neblina", ou traduzindo para nosso português coloquial: "Não jogue sujeira para debaixo do tapete".
Essa ideia é bem conhecida - todos nós, arrisco até a dizer, sem exceção, temos alguns assuntos de que não gostamos de entrar em contato. Entretanto, mesmo aqueles assuntos indesejáveis que evitamos podem, muitas vezes, trazer ideias sobre novas atitudes e aprendizado para situações futuras.
Peterson traz principalmente aquelas situações desconfortáveis em relacionamentos, sejam eles entre os cônjuges, parentes, amigos e até colegas de trabalho. Pequenos incidentes que ocorrem regularmente os quais deixamos passar porque achamos desnecessário comentar, podem transformar-se em grandes monstros depois de um tempo, podendo até causar a ruptura do relacionamento.
Para melhor elucidação do tema, trarei alguns exemplos.
O primeiro exemplo é do próprio Peterson. Sua sogra costumava preparar o almoço de seu marido - ele trabalhava como corretor de imóveis e vinha almoçar todos os dias em casa. Ela sempre fazia uma sopa e um sanduíche. Um dia, sem aviso prévio, ele gritou com sua esposa: "Por que sempre comemos nesses pratos pequenos? Eu detesto comer nesses pratinhos minúsculos."
Ela sempre servia o sanduíche num prato pequeno, desses de bolo, ao invés de um prato regular para comida. Ela o servia nesses pratos pequenos há, aproximadamente, vinte anos e ele nunca falou nada. Ela nunca imaginou que ele detestasse comer nesse tipo de prato.
Essa história pode parecer hilária e sem importância, mas num relacionamento, isso, depois de um tempo, pode se tornar um tormento, principalmente para a pessoa que se cala e de uma hora para outra, resolve "chutar o pau da barraca".
O segundo exemplo é de uma paciente de Peterson.
Ela o procurou por conta de uma situação de trabalho. Ela era uma contadora e estava pensando em abrir seu próprio escritório e sair de uma grande corporação na qual trabalhava. A transação, no decorrer das sessões, ocorreu sem problemas, mas ela continuava insatisfeita. Em realidade, o seu problema principal era o casamento.
Ela descreveu seu marido como uma pessoa extraordinariamente autocentrada e ao mesmo tempo, preocupada em como era vista pelas outras pessoas. Apesar do narcisismo de seu marido (ao menos do ponto de vista dela), ele era escravo das opiniões de todas as pessoas que ele encontrava - exceto os membros de sua própria família. Ele também bebia muito - um hábito que exagerava suas características de temperamento.
A paciente de Jordan Peterson não mais se sentia confortável em sua própria casa. Ela não sentia que havia alguma coisa dela dentro do apartamento que ela compartilhava com o marido (eles não tinham filhos). Toda a mobília da casa, a qual ela descreveu como ostensiva, desconfortável, tinha sido escolhida pelo marido.
Ele colecionava pinturas, quadros e objetos das décadas de sessenta e setenta (arte pop) dos quais ela não apreciava. As paredes da casa eram cheias desses itens que ele passou durante muitos anos procurando em galerias de arte, e frequentemente, ela, nessas visitas às galerias, ficava do lado de fora, esperando no carro.
Acostumada com essa rotina, ela nem se dava conta do que realmente gostava. Disse que gostava da casa com menos objetos, ou até disse isso por conta do excesso de coisas dele. Como ela não sabia realmente do que gostava e até do que não gostava, era difícil expor suas opiniões.
Com certeza, ela não se sentia bem em ser uma estranha em sua própria casa. Por esse motivo quase não recebia visitas e, embora esse parecesse um problema menor para ela, o mesmo contribuiu para que ela se sentisse isolada.
Com o tempo, a casa ficava cada vez mais lotada de coisas do marido e cada vez mais seu casamento tinha menos coisas dela mesma. Apesar disso, ela nunca declarou guerra; nunca teve um ataque genuíno de raiva; nunca diretamente confrontou o fato que ela odiava sua casa e a sua submissão aos gostos do seu marido. Ao invés disso ela permitiu que isso continuasse acontecendo sem falar nada - ela achava que não devia discutir sobre essas coisas triviais. Ela acreditava que, se iniciasse uma discussão, arriscava incluir todas as coisas que eram problemáticas em seu casamento. Ela não queria isso. Então ela permanecia calada - embora se sentisse ressentida e cronicamente reprimida.
Em realidade, os objetos de arte pop não eram simples objetos materiais. Eles eram itens importantes de informação a respeito do casamento dela e com certeza foi visto e sentido desta maneira por ela. Cada objeto de arte foi uma realização concreta de vitória para ele e uma derrota para ela.
Assim, após 30 anos de casamento, sem surpresa para ninguém, o casal se separou. Jordan Peterson acredita que o marido ficou com toda a mobília e os objetos de arte.
Aqui, Peterson dá um pequeno conselho - cada discordância trivial ou crônica sobre comida, pratos, faxina, responsabilidade pelas finanças, etc. será cada vez mais aumentada, até você ou vocês como casal, discutirem a situação. Talvez, você pense que é melhor evitar o confronto e continuar "flutuando" em aparente, mas falsa paz. Não se iluda: a cada dia que passa, o que te incomoda começa a incomodar absurdamente e chega o dia da explosão. Entretanto, se sempre há diálogo e cada um pode dizer o que gosta, o que não gosta, o que incomoda, o outro pode até mudar ou adaptar seu comportamento e pode ter a oportunidade de ser alertado sobre o que incomodava o outro - talvez ele nem percebesse. Essa é uma boa maneira de trazer harmonia para um casamento, ou outro tipo de relacionamento.
Não finja que você é feliz numa situação a qual você não é. Há sempre uma solução razoável que, em princípio, pode ser negociada. E se não puder ser negociada, discuta sobe ela - coloque seu ponto de vista e ouça o ponto de vista do outro. Não acredite que as coisas são triviais, mesmo que sejam os pratos do almoço ou os móveis da casa. A vida se repete no cotidiano e seria bom que as repetições do dia a dia fossem harmônicas.
Nesses exemplos podemos notar o "pecado" da omissão num relacionamento - se omito o que penso, o outro não tem como avaliar se estou ou não gostando da vida de relação que levo com ele. Acredito que, regulamente, deveríamos conversar sobre o que gostamos ou não gostamos ou o que nos move para frente. O outro não é adivinho. Uma boa conversa faz parte de um relacionamento saudável - essa, nos auxilia a caminharmos todos numa mesma direção em crescimento pessoal contínuo.
E você? Tem alguma história de omissão para compartilhar?
Boa semana!
Estou refletindo com meus botões:🤔 o que faz alguém aceitar o que não quer num relacionamento. Não magoar a pessoa, orgulho, comodismo? Minha omissão é ajudar as pessoas materialmente sem comentar com o marido, senão já vem o comentário: "não dá prá ajudar todo mundo".
ResponderExcluirInteressantíssimo, Sonia. De todos os pontos, o que mais me chama a atenção é a fuga do conflito; muitas vezes não percebemos que fugimos uma vida inteira de situações que nos incomodam, mas que nos acostumamos. Mas sempre há tempo para o despertar e para o descobrir. Abraços
ResponderExcluirCom certeza. O texto serve como um alerta. Busquemos perceber o que ainda nos escraviza e nos libertemos para obter a plenitude que almejamos e merecemos na vida.
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